Capítulo 11
1
Jesus conversava (orava) com Deus costumeiramente (5.16; Mt 14.23; Mc 1.35) e, mais ainda em ocasiões especiais, como em seu batismo (3.21), na escolha dos seus apóstolos (6.12), no Getsêmani (22.41). Os discípulos observaram essa prática devocional e disciplina espiritual de Jesus e quiseram aprender como estabelecer esse nível de comunicação com Deus. Diante desse desejo manifestado pelos discípulos, Jesus nos ensina um modelo de oração e não um mantra ou reza repetitiva. Por isso temos uma sugestão em Mateus (Mt 6.9-13) no Sermão no Monte, e outra, de forma resumida, aqui.
2
Jesus ensina que devemos iniciar nossas orações expressando a mesma intimidade, carinho e respeito que uma criança amorosa e obediente tem por seu pai. Mais uma vez Jesus faz um jogo com as palavras para demonstrar o quanto é fácil confundir "religião formal" com "adoração sincera". Jesus afirma que devemos nos dirigir a Deus como Abba (em aramaico, papai ou paizinho querido – Mc 14.36; Rm 8.15. Gl 4.6), denotando assim o verdadeiro sentimento que há no coração de Deus para com seus filhos. Sentimento este que deveria igualmente inundar nossa alma e que nos ajudaria a compreender melhor a pessoa do Senhor e seu modo de agir na história. Os líderes religiosos judeus costumavam iniciar suas preces com a palavra hebraica transliterada Abinu com o acréscimo de alguma expressão que significasse que Deus estava no céu. Este tipo de formalismo e protocolo – jamais requerido por Deus – tendia a colocar o ser humano numa posição de quase inacessibilidade a Deus. Um tipo de relacionamento parecido com o que os pagãos tinham com seus deuses, e por isso precisavam lhes oferecer sacrifícios, autoflagelos e mantras infindáveis a fim de obter um pouco da atenção e graça divinas.
3 Depois de certificar-se de que pode chamar a Deus de Pai (Jo 1.12), o discípulo deve exaltar o nome do Senhor. Os nomes na antiguidade judaica tinham um significado intrínseco muito maior do que nos dias de hoje que resumia a totalidade do caráter de uma pessoa. Por isso, Jesus mudou o nome de algumas pessoas quando foram convertidas, pois suas filosofias de vida (a maneira de pensar e viver) haviam sido completamente alteradas ao se tornarem seguidoras de Cristo. Deus é Pai, que significa o Criador: Aquele que dá origem ao ser humano. É nosso "paizinho" mas também é nosso Senhor, esse é o caráter de Deus (amor e justiça) e merece toda a nossa reverência (de alma). Expressamos o Deus que vive em nós através de nossas atitudes (1Pe 1.14-21; 3.15). Logo em seguida, enquanto ora, o discípulo deve almejar a implantação do Reino de Deus na terra. Esse alvo de Jesus deve ser a missão dos seus discípulos: que todos os povos, raças e culturas, sejam contemplados com a Salvação e que um sistema global de amor e justiça permeie toda a terra (Mt 28.18-20). Devemos orar, pois essa missão cumpre-se parcialmente quando uma pessoa aceita a Jesus como seu Salvador e Senhor pessoal, mas ainda esperamos pela total e perpétua remissão de toda terra, quando Cristo voltar em glória. A oração continua, e agora o discípulo está pronto para, reconhecendo que Deus é quem provê o sustento diário e eterno (em grego epiousion, que significa, "dia a dia", "cotidiano", "para amanhã e depois"), suplicar agradecido pela provisão de amanhã enquanto coloca mãos à obra. Seu trabalho não visa apenas ganhar o sustento, mas sim prestar glória ao Senhor e dar testemunho ao mundo (Jo 6.35 e 4.32 com Pv 30.8 e Ap 19.9). Esta perspectiva cristã do trabalho faz toda a diferença. O pecado é considerado como uma dívida que precisa ser paga. Deus é o Criador de toda a terra e da humanidade, portanto, tudo o que somos e temos pertence a Deus. Quando desobedecemos ao Senhor, estamos roubando os direitos de Deus e ficamos em pecado (em dívida). Assim como o Senhor provê diariamente recursos para nosso sustento, também nos oferece seu perdão em Jesus Cristo. Da mesma maneira, devemos estar dispostos a perdoar nossos semelhantes todos os dias. Viver a vida cristã dentro desse padrão é correr o risco de ser tentado (em grego peirasmos que também significa um tipo de "teste" ou "prova") a todo o momento. Deus não "tenta" a ninguém, mas "prova" a todos os seus filhos (Mt 9.1; 6.9-15; Dt 8.1-5; Tg 1.13; Hb 2.17); Jesus está nos ensinando a ficar alertas e fugir das inúmeras ciladas do Inimigo, que tem o objetivo de nos persuadir a viver abaixo do padrão moral de Deus para nos condenar (1Co 6.18; 10.14; 1Tm 6.11; 2Tm 2.22) e com isso, neutralizar nossa missão de testemunharmos e implementarmos o Reino de Deus no mundo.
4 Lucas é o evangelho da oração e nos revela o apelo de Jesus para que sejamos ousados e perseverantes na oração (vs. 5-8), nos oferecendo total garantia de que Deus responde às nossas súplicas (vs. 9-13). O argumento é que se nós que estamos sob a influência do pecado universal (13.1-9), ainda assim, somos amorosos para com nossos filhos, quanto mais o Pai da humanidade fica feliz em presentear seus filhos com os dons espirituais, sendo o primeiro e maior deles o dom da Salvação (1Co 12.13). Todo crente em Jesus tem o Espírito Santo (At 1.8; Gl 5.22), mas quando pedimos para que o Espírito dirija nossas vidas abrimos a alma para sua maravilhosa e completa ação (Ef 4.30 com 1Ts 5.19).
5 O sinal que tanto buscavam estava diante deles. Jesus acabara de expulsar o Mal e curar aquele homem cego, surdo e mudo (Mt 2.22-30; Mc 3.20-27). Mas, os olhos dos legalistas, obscurecidos pelo pecado, não podiam enxergar as maravilhas realizadas por Jesus em palavras e atitudes. Ao afirmar que Jesus exorcizava sob o poder do inferno (Mt 12.24), não compreendiam que aquele esconjuro era a maior prova que Jesus agia pelo poder de Deus, pois que o reino do mal não está dividido. Os demônios não lutam entre si, somente os homens agem assim. A expulsão do demônio evidencia a chegada do Reino de Deus e a derrota do príncipe deste mundo.
6 O Reino de Deus havia chegado no sentido de o Rei estar presente na pessoa de Cristo (4.43) e de os poderes do mal estarem sendo vencidos. O Diabo (também chamado de "valente" ou "homem forte") prende e escraviza a todos que consegue dominar, mas somente até a chegada de Jesus, que tem plena autoridade e poder para destruí-lo; bem como aos seus exércitos e resgatar a humanidade (Cl 1.13; 2.15; Hb 2.14).
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A neutralidade no Reino de Deus é inaceitável e impossível. Quem não apóia sinceramente a Jesus, seus ensinos e Igreja, opõem-se ao Senhor. Entretanto é preciso cuidado para não censurar os que estão do lado de Cristo como se não estivessem. Aquele obreiro citado em 9.50 não era membro do grupo dos Doze, nem dos setenta e dois, mas fazia a obra em nome de Jesus e o Senhor não o condenou (Mc 9.38-39).
8 O ministério dos exorcistas judeus era ineficaz (v.19), pois afugentavam os demônios por algum tempo, mas não aceitavam o Reino de Deus em seus corações (Mt 12.43-45). Quando uma pessoa é liberta da opressão do mal deve abrir seu coração para que seja cheio do Espírito Santo de Deus: a única maneira de viver livre do controle do Diabo. Uma vida reformada, mas sem a presença do Espírito Santo fica sujeita a ser novamente tomada pelo mal.
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Maior privilégio do que ser a própria mãe de Jesus e compartilhar da humanidade de Deus é compreender e aceitar a mensagem salvadora de Jesus Cristo e participar do seu corpo espiritual (Tg 1.22).
10 O profeta Jonas ficou três dias "sepultado" no interior de um grande peixe e depois voltou à terra de Israel. Desta mesma forma, Jesus seria ressuscitado depois de três dias do seu sepultamento (Mt 12.40; Jo 14.11; Jn 3.4).
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Gentios, como a rainha de Sabá (1Rs 10.1-10) e os ninivitas, testemunharão, no juízo, contra os incrédulos judeus; porque, ao perceberem um pouco da glória de Deus, não endureceram ainda mais seus corações e se arrependeram de seus pecados. Entretanto, os judeus estavam diante do fulgor da luz divina irradiada de Jesus Cristo e não conseguiam ver o Reino e a glória de Deus. Todos têm alguma luz; todavia, a responsabilidade aumenta, conforme a intensidade da luz do evangelho (Jo 1.9; Rm 1.20; 2.5).
12 As pessoas que pedem sinais não precisam de mais luz e sim de ampliar sua percepção, a capacidade de ver e analisar com olhos espirituais. A candeia tem o poder de iluminar todos aqueles que se aproximam dela, tanto mais quanto mais perto estiverem. A luz de Cristo e de Sua Igreja jamais será apagada, mas continuará brilhando até os confins da terra, oferecendo a oportunidade da Salvação a todos os povos, raças e culturas; atraindo para Si todos os que têm "olhos bons" (abençoados por Deus), fazendo-os ingressarem no Reino e participarem da fulgurante luz de Cristo.
13 A expressão "fariseus" significa em hebraico "os separados", e era usada para identificar uma seita político-religiosa que lutava pela segregação da cultura judaica. Eles aguardavam a vinda de um Messias político, que obrigasse o povo a seguir todas as leis e ordenanças da tradição rabínica e legalista criada por eles para explicar o AT. O ato cerimonial de se lavar (verbo grego: baptizõ) várias vezes antes das refeições, não era ordenado na Lei, mas fora acrescentado pelos fariseus (Mt 7.3; Mt 15.9).
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A mais perigosa insensatez é pensar que Deus se preocupa mais com as cerimônias exteriores do que com o sentimento sincero da alma humana (Is 1.10-17). Jesus nos adverte para que não tentemos ser mais reais do que o Rei em nossos procedimentos e relacionamentos. Os fariseus estavam dando muito mais atenção a formas rígidas de comportamento do que a uma vida moral limpa e generosa para com Deus e os nossos semelhantes (Mc 7.20-23).
15
O amor sincero ao próximo, que se reflete em atitudes práticas e concretas de respeito, solidariedade e cooperação, é um dos mais significativos atos de purificação espiritual e adoração a Deus. Os líderes religiosos e políticos devem ter muito cuidado com a demagogia, pois é comum falarem do que não fazem. Exortam o povo às atitudes humanitárias e projetos sociais; contudo, eles próprios não se desprendem de seus bens materiais, amor ao poder, egoísmo e vaidades (19.8).
16 Os judeus costumavam pintar seus túmulos com cal para que ninguém por acidente tropeçasse ou tocasse neles e, dessa forma, ficasse contaminado ou "imundo cerimonialmente" por sete dias (Nm 19.16; Mt 23.27). Assim como tocar em um túmulo resultava em "impureza", Jesus afirma que associar-se aos "fariseus" (aos legalistas) podia levar à "impureza moral" e proclama três maldições contra isso: Aqueles que colocam as normas e estatutos religiosos acima do amor a Deus (1Co 16.22) e da justiça (Fp 3.9); aqueles que valorizam a honra e os elogios das pessoas acima da glória de Deus (Jo 12.43); e aqueles que contaminam seus semelhantes ao invés de conduzi-los a Jesus Cristo e, portanto, à Salvação (Hb 12.15 com Tg 5.20).
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Os advogados da Lei (peritos e intérpretes da Lei) sobrecarregavam o povo com regras e regulamentos acrescentados à Lei original de Moisés (Mt 15.2), sem nada fazer para ajudar as pessoas a guardar essas leis (Mt 23.4). De outro lado, eles estavam criando atalhos legais e normas especiais para se safarem incólumes da necessidade de eles próprios terem que cumprir tais leis. Esses "homens da lei" eram demagogos. Honravam a memória dos profetas construindo ou reformando seus túmulos e monumentos; porém, no íntimo e na prática, rejeitavam a Cristo e a proclamação dos ensinos dos profetas, da mesma maneira como acontecera com seus antepassados.
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O genocídio ocorrido em Israel entre os anos 66 e 70 d.C. foi o cumprimento dessa terrível advertência profética. Os exércitos romanos dizimaram impiedosamente quase toda a nação judaica (21.20-24). Esse é um dos eventos históricos que demonstra a implacável justiça de Deus contra aqueles que rejeitam seu conselho e mandamentos. Pior ainda será o castigo contra aqueles que rejeitarem o Filho de Deus (20.14).
19 Os judeus suplicaram por profetas de Deus, mas quando eles chegaram – a exemplo de Jesus – foram perseguidos, injuriados e assassinados. O sangue inocente de cada um desses homens de Deus será requerido pelo Senhor dessa geração incrédula e perversa. Abel foi o primeiro servo do Senhor martirizado (Gn 4.8), considerado por Jesus como profeta. A morte de Zacarias foi a última morte de um profeta do AT, levando em conta a seqüência dos livros na ordem hebraica tradicional, começando com o Gênesis e terminando em 2 Crônicas (2Cr 24.21-22). Jesus está afirmando que o sangue de todos aqueles que sofreram e foram mortos por sua fidelidade a Deus seria requerido. As contas desses atos criminosos seriam prestadas pela geração que compartilhou plenamente das atitudes que levaram a efeito a morte dos profetas (incluindo o próprio Filho de Deus).
20
O "Ai" final de Jesus vai para os escribas (advogados e intérpretes da Lei) e teólogos. Aqueles que dominam o conhecimento e têm a responsabilidade de comunicar o saber à sociedade e apontar o Caminho de Deus ao povo. Tomaram posse da chave da ciência que destrava o significado mais profundo das Escrituras. Mas, ao invés de tornar simples e prático o viver com Deus, angustiavam o povo com a imposição de ordenanças e mitos teológicos. Por fim, esses próprios doutores da Lei, transformaram a Bíblia num livro de obscuridades e foram enredados por suas próprias teorias místicas. Não conseguiam perceber a Graça, a amplitude e o poder da Palavra de Jesus nem mesmo deixavam prosseguir no Caminho aqueles que se aproximavam da Verdade (Jo 14.6) e do Reino de Deus.
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Capítulo 12
1 Somente Lucas usa a expressão "multidão de milhares" (miríades) de pessoas, que deriva da palavra grega murias (dez mil). Em Atos 19.19, "cinco miríades" correspondem a 50.000 denários. Entretanto, o termo é freqüentemente usado de modo indefinido, referindo-se às grandes multidões que seguiam Jesus à toda parte. O fermento é a influência que corrompe (1Co 5.6). O perigo da hipocrisia e arrogância não se limita aos fariseus e líderes religiosos, mas aos crentes em geral.
2 Nesse contexto, o sentido é que nada há escondido pela hipocrisia e arrogância que não venha a ser, de fato, transparecido ou dado a conhecer pela convivência e ao longo do tempo. Assim também, como a Palavra de Deus traz à luz os segredos e as verdadeiras motivações da alma (Hb 4.12), o juízo final revelará tudo o que não for objeto de confissão, arrependimento e perdão (1Jo 1.9).
3 Durante os tempos de provação e perseguição, a fé dependerá da consciência clara em relação à infinita diferença que há entre a simples morte física e a morte eterna da alma. Tememos ao Senhor por sua justiça implacável (Tg 4.12), mas nele confiamos, pois Ele é amor e governa sobre tudo e todos (Rm 8.28-39). Somente Deus tem em suas mãos o poder da vida e da morte. Os versos 6 e 7 apresentam os fundamentos da nossa confiança. A palavra grega traduzida aqui por inferno é geenna, e não deve ser confundida com outra expressão grega hades, que se refere ao nome genérico do lugar dos mortos (Mt 5.22). É importante notar, que no NT, inferno é usado somente em Mateus, Marcos, nessa passagem de Lucas e em Tiago 3.6.
4 Deus dedica grande cuidado às pequenas criaturas, mesmo àquelas que, em geral, os seres humanos atribuem pouco interesse e valor. Na época, os pardais faziam parte da alimentação dos pobres. Existem três palavras que denotam moedas romanas: denarius (Mt 18.28), assarion (Mt 10.29) e kodrantes (ou centavo - Mt 5.26). O lepton era uma moedinha que valia apenas metade de um centavo.
5 Aqui essa expressão tem uma aplicação mais ampla do que em Mt 12.31 e Mc 3.28,29. Desde os pensadores cristãos dos primeiros séculos da Igreja (também chamados de "pais da Igreja"), essa passagem é compreendida como sendo uma advertência à imperdoável apostasia daqueles que assumiram um compromisso de fé ao lado de Cristo e da Igreja (Hb 6.4-8), em comparação com a palavra de rejeição a Cristo, própria daqueles que não têm fé, e, portanto, passível de perdão pela Salvação ainda disponível a eles.
6 Não existe melhor advogado do que o Espírito Santo, nem melhor defesa do que um coração completamente controlado pelo Senhor (1Pe 3.15).
7 Jesus não pode mediar um coração dominado pela avareza, para isso já existe a Lei (Dt 21.17), que promulgou a regra geral de que um filho mais velho receberia o dobro da porção de um filho mais jovem. Essas eram questões comumente ajuizadas pelos rabinos que, em muitos casos, recebiam uma porcentagem dos acertos firmados. Entretanto, esse homem estava completamente tomado pelo egoísmo e materialismo e precisava, portanto, em primeiro lugar, arrepender-se para entender as grandes prioridades do Reino e poder aceitar de bom grado as orientações de Jesus.
8 A vida é muito mais do que possuir. O rico era louco porque não compreendia que as suas posses eram apenas emprestadas (1Tm 6.17). Ninguém consegue poupar (guardar) as bênçãos de Deus apenas em benefício próprio (1Tm 6.18). A vida terrena não tem mais valor do que a vida eterna. Conclusão: A única riqueza duradoura é receber o Espírito Santo, guardá-lo no coração e investir seus dons em benefício do próximo e da sociedade (v.21 e Jo 17.3).
9 Tolo (insensato ou louco) é uma expressão de grande impacto em sua forma original, e procura demonstrar o disparate que há em buscar segurança nos bens e riquezas deste mundo em detrimento da presença e bênçãos eternas de Deus (11.40 e Ef 5.17).
10 Jesus passa agora a ensinar àqueles que o amam e o seguem a maneira sábia de viver, em contraste com a visão tresloucada do egoísta e avarento da parábola anterior. Embora nossa visão do futuro deva concentrar-se no Reino de Deus (v.32) e na vida eterna, a vida terrena é decisiva para determinar nossa condição eterna (Mc 8.35-37).
11 A cada dia os seres humanos se preocupam mais e mais com a manutenção da boa saúde e o prolongamento da vida (Mt 6.27). O medo da morte é inversamente proporcional à certeza da salvação. Contudo, somente o Senhor é capaz de nos fazer crescer, ainda que alguns centímetros, ou aumentar nossos dias de vida na terra (Is 38.1-8).
12 A expressão grega zeteite significa muito mais do que "indagar" como aparece em algumas versões. Seu sentido tem a ver com uma busca obstinada e concentrada: "buscai". Jesus explica que podemos aplicar todos os nossos esforços em ganhar o mundo (títulos, bens, poder), ou o Reino de Deus. Aquele, entretanto, que "busca" o reino receberá tanto um quanto outro, conforme a sua necessidade e o propósito do Pai para cada um dos seus filhos.
13 Desde a Criação o grande desejo do Pai é partilhar seu Reino com seus filhos, por isso, é com muita alegria e satisfação que, agora, em Cristo, o Senhor pode realizar plenamente sua vontade. Jesus adverte que, nesse sentido, "temor" e "ansiedade" são características dos incrédulos (verdadeiros "gentios" v.30), mas não dos "filhos" de Deus (minoria fiel). O Reino de Deus começa pela soberania do Senhor sobre a vida dos seus súditos (Rm 14.17). Para nós, não acostumados aos regimes monárquicos, e com um sistema político carente de verdadeiros homens e mulheres de Deus, fica um tanto difícil compreender esse tipo de nobre metáfora.
14 Lucas é o evangelista que mais enfatiza a ação social cristã, com vistas a oferecer aos pobres as mesmas condições medianas da sociedade (3.11; 6.30; 11.41; 14.13,14; 16.9; 18.22; 19.8). Os bens e a riqueza que estiverem impedindo o cristão de buscar e adentrar o reino devem ser doados aos mais necessitados (Mc 10.21-27; 1Tm 6.9,18). É fácil notar onde está depositado nosso verdadeiro ideal de vida e paixão: onde nosso coração mais se dedica, cuida e zela.
15 Esse versículo é um resumo da parábola das dez virgens (Mt 25). Algumas versões trazem a frase "cingido esteja o vosso corpo", optando, nesse caso, por uma tradução mais literal do original. Essa expressão tem a ver com o antigo costume oriental de amarrar as longas vestes à altura da cintura, a fim de possibilitar, em caso de necessidade, uma movimentação mais livre e acelerada. Jesus, por certo, fez uma alusão ao fato dos cristãos deverem estar sempre prontos para servir, livres de qualquer embaraço (1Pe 1.13).
16 O Senhor continuará a ser o grande provedor dos seus servos (filhos e amigos) que se mantiverem "vigilantes", "despertos", "preparados", "prontos", em contraste com os que estão "dormindo (mortos) em pecados" (Ef 5.14; 1 Ts 5.10). A morte (v.20) e o glorioso retorno estão sempre iminentes (vv 36-40). As exigências do reino (atenção, prontidão e vigilância) são relevantes tanto para os que morrem antes do Juízo como para os que estarão vivos naquele grande dia.
17 O "assaltante" é aquele que vem de sobressalto, repentinamente e surpreendendo a todos. Não há tempo para se preparar, é preciso viver em condição de prontidão, pois a qualquer momento se dará o "assalto". Esse era um meio de comunicar o estado de alerta espiritual aos judeus cristãos, haja vista que o povo judeu sempre viveu – e vive – em estado de contínua atenção e vigilância em relação aos ataques inimigos (21.34; 1Ts 5.2; 2Pe 3.10; Ap 3.3; 16.15).
18 Tanto as honrarias quanto os castigos, segundo o mérito pelo procedimento de cada um, não aguardam somente os apóstolos; mas, a todos os servos do Senhor que viverem no intervalo histórico entre a ascensão e o glorioso retorno de Jesus Cristo. Quanto maiores os privilégios, mais severa será a punição dos infiéis e incrédulos (Rm 2.12-16).
19 O galardão pela fidelidade em cumprir a vontade do Senhor será "honra" e "responsabilidade" ainda maiores. Os crentes e líderes cristãos que levam uma vida sem disciplina no presente, enfrentarão a ira de Deus (Mt 7.15-27).
20 Jesus estabelece um contraste entre os líderes irresponsáveis (vv 45-47), e os demais cristãos, mal instruídos que se permitem viver sob a direção do egoísmo, da arrogância e que duvidam das promessas gloriosas; todos receberão o justo castigo no tribunal de Cristo (2Co 5.10). Certamente haverá um castigo para aqueles que deixam de cumprir seu dever. A responsabilidade recai sobre aqueles que muito receberam (Am 3.2). As pessoas não serão castigadas apenas pelo mal que praticaram, mas também pelo bem que deixaram de fazer (Tg 4.17). O fato de não conhecer a Palavra ou a ignorância não podem ser usados como desculpa para evitar a punição futura, pois não existe ignorância moral absoluta (Rm 1.20; 2.14,15), e nossa ignorância faz parte de nosso pecado.
21 Aqui o "fogo" é uma metáfora do Juízo que começou a "arder" na crucificação de Jesus Cristo. Jesus afirma também que suportará o julgamento de Deus no lugar dos crentes, e estabelece um forte vínculo entre "batismo" e "morte" (Mc 10.38-39 e 1Jo 5.6-8). Jesus contemplava com horror o momento da cruz, mas com submissão total e resoluta à sua inevitável missão de salvar a humanidade. Por isso, seu Espírito foi derramado com poder sobre todos os crentes (At 1.8; 2.1). Entretanto, aqueles que rejeitarem o seu sacrifício e apelo serão condenados ao juízo do fogo eterno (3.16; Mt 25.46).
22 O poente ficava na direção do mar Mediterrâneo (1Rs 18.44). Os ventos do sul sopravam do deserto do Neguebe e traziam muito calor. Embora as pessoas, desde a antiguidade, soubessem compreender e usar esses indicadores atmosféricos para prever climas, estações e tempos, não conseguiam perceber a gravidade da sua incredulidade e dos próprios pecados, a importância histórica daqueles momentos em que Deus andou sobre a terra na pessoa de Cristo, a chegada do Reino de Deus, e muito menos, o terrível julgamento que se avizinhava com o massacre do povo judeu pelos exércitos de Roma e suas conseqüências eternas.
23 Jesus nos ensina que acima das tradições religiosas e dos sistemas de leis de um povo, está a Palavra de Deus. Os sinais dos tempos eram nítidos (como o são hoje) e uma decisão radical e urgente de arrependimento e volta à Palavra se fazia necessária, mas as pessoas não conseguiam ver o terrível furacão do juízo tomando forma. É preciso acertar as contas antes que seja tarde demais. A expressão grega lepton foi traduzida como "último centavo" e representava uma pequena moeda de cobre ou bronze cujo valor correspondia à metade da kodrantes (um centavo).
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Capítulo 13
1
Segundo o historiador judeu Flávio Josefo, contemporâneo dos apóstolos de Cristo, em sua obra "Antiguidades", os galileus eram conhecidos como insurgentes, e Pilatos, por sua crueldade ilimitada.
2
Na antiguidade, especialmente no AT, acreditava-se que grandes desgraças aconteciam aos crentes que cometiam grandes pecados. Esse, por exemplo, foi o argumento de alguns dos amigos de Jó (Elifaz em Jó 4.7; 22.5). Jesus, porém, adverte aos que se acham "justos" sobre o pecado da arrogância espiritual e da auto-suficiência (18.9-14), pois não percebem a sua necessidade de arrependimento diário. O pecado é inerente ao ser humano desde a Queda (Gn 3); contudo, Deus não usa o castigo conforme a lógica humana (Jo 9.1,2).
3
Somente Lucas, em toda a Bíblia, cita esse acontecimento, observado por Jesus para lembrar a doutrina do pecado original e a necessidade que todos temos de arrependimento.
4 Essa parábola tem um sentido muito amplo, pode referir-se a Israel como também a cada um de nós (Mc 11.14).
5 Os três anos citados por Jesus nessa parábola representam um período de vários séculos de graça e oportunidade que Deus garantiu a Israel por ocasião da Aliança e que culminaram com a chegada e a proclamação do Evangelho (Cristo).
6
Deus exige frutos e não simplesmente folhas; vida e não somente palavras e promessas (Mt 7.21-27). A aparente demora no juízo não significa indiferença ou inoperância, pelo contrário, é Deus usando de sua incomensurável paciência e bondade, na esperança do fruto de arrependimento (3.8 com 2Pe 3.4-10). Todavia, mais cedo ou mais tarde a lâmina do machado da justiça punitiva de Deus cairá com severidade sobre toda raiz de vida inútil, a qual não aceitou o enxerto da nova vida em Jesus (Mt 7.16; Rm 11.16-24; Cl 1.6,10). O juízo deveria ter caído sobre Israel imediatamente após a crucificação do Filho de Deus, entretanto, o Senhor concedeu – a pedido do Vinicultor – uma derradeira oportunidade especial que ocorreu entre o Pentecostes e a destruição completa de Jerusalém (66-70 d.C.).
7
O chefe da congregação dos judeus (sinagoga) preocupou-se mais com sua tarefa de pôr ordem no serviço religioso (culto) do que com a salvação (cura) de um ser humano (Êx 20.9,10). Passagens anteriores que relatam a dificuldade que mestres e líderes judaicos tinham em compreender o significado do sábado, revelam a autoridade de Jesus Cristo sobre esse dia (6.1-11; 14.1-6; Mt 12.1-8,11,12; Jo 5.1-18). Aqui se evidencia o significado do dia do descanso. Desde o princípio, o sábado (em hebraico transliterado shabbãth – descanso no mais amplo e absoluto sentido da palavra), era profético, relembrando a reconsagração da Criação à sua finalidade original, o que só se realizará de maneira completa por meio da derrota final de Satanás (v.16). Essa vitória total é prevista na libertação da mulher de quem foi expulso o espírito de enfermidade (v.11,12), cuja tradução literal e original da frase de Jesus seria: "foste libertada para permanecerdes livre". Jesus usou o exemplo vivo daquela mulher para deixar seu último ensino e a maravilha das suas ações de poder na congregação dos judeus. Jesus jamais voltaria a uma sinagoga.
8 Jesus exalta o valor da mulher, ressaltando que ela, como todos os homens, é herdeira nacional e espiritual do Pai dos fiéis (1Pe 3.6) e que, pela fé, viu sua busca de muito anos ser agraciada com o chamado (Jesus a viu e a chamou ao centro da congregação) e o toque salvador (curador) do Senhor (v.12). Os líderes religiosos estavam dando mais valor e respeito aos animais de carga do que aos seus semelhantes; e, por isso, Jesus afirmou que eram hipócritas, pois fingiam ter zelo pela Lei, mas tramavam desmoralizá-lo e matá-lo.
9 Tanto nas plantações quanto na cozinha (onde a alimentação é preparada), como no mundo e nas almas humanas, a implantação e o desenvolvimento da nova natureza do reino não podem permanecer ocultos ou tímidos. A vida do Espírito de Deus se manifestará em todo indivíduo que aceitar a salvação de Jesus, depois se refletirá na congregação dos justificados pelo sangue do Cordeiro (a Igreja) e, como conseqüência, afetará e influenciará o mundo todo (Ap 5.9). Em geral, árvores e aves simbolizam nações, nessa passagem, Israel (Ez 17.23; 31.6; Dn 4.12,21) e os gentios salvos que – em Cristo – terão livre acesso ao Evangelho e à mesma assembléia dos filhos de Deus (Ef 3.6).
10 No original, a expressão grega três satos significa uma grande quantidade de farinha (pouco mais de 10 quilos). A mesma quantidade usada por Sara em Gn 18.6. No primeiro século da Igreja, a ignorância dos pagãos (gentios) em relação ao Reino de Deus em Cristo era quase total. Entretanto, com o passar dos séculos, o Cristianismo se tornou a maior das religiões da terra.
11
Em algum momento entre os acontecimentos registrados em 11.1 e 13.21, Jesus partiu da Judéia para iniciar sua ministração aos povos da Peréia e terras vizinhas (Mt 19.1; Mc 10 e Jo 10.40-42). Embora realizasse grande obra na Peréia e em muitas outras terras, onde repetiu vários de seus ensinos e prodígios, seus olhos e coração estavam voltados para a Cidade Santa (terra das profecias), para onde caminhava resoluto, ao encontro do seu destino final nesta terra em benefício da humanidade.
12 No verso 22 começa uma seção que vai até 16.13, com o objetivo de responder a duas questões especiais, que muito preocupavam os teólogos da época de Jesus e de hoje: "Quem entrará no Reino de Deus?" e "Serão poucos ou muitos os que terão esse acesso privilegiado?". Apesar das multidões que vinham à procura de curas e outras bênçãos, Jesus não é claro sobre o número dos salvos, mas adverte que muitos tentariam buscar a salvação (entrar no Reino) depois de ser tarde demais (portas fechadas). O verdadeiro salvo não é necessariamente o religioso e bem instruído, mas sim aquela pessoa que, arrependida de sua condição mundana e pecadora, sente o desejo inesgotável de, em Cristo, lutar (no original grego transliterado agõnizõ – concentrar toda a atenção e força), pois a porta é estreita e não permite que passemos carregando nosso "Eu" nem o "mundo" (v.24). Além disso, devemos passar com urgência – sem deixar essa decisão para amanhã – pois poderá não haver mais tempo (2Co 6.2). Imbuídos de toda a santificação, sem a qual não é possível ver o Senhor (Hb 12.14), e cheios do Espírito Santo (Rm 8.4). A mesa no Reino se refere ao grande banquete messiânico (Mt 22.2; Ap 19.9) onde, para surpresa dos judeus ortodoxos e outros legalistas, muitos gentios cristãos estarão presentes (Rm 11.11-25).
13 Herodes Antipas não admitia qualquer perturbação ou revolta nas suas terras, e Jesus estava na Transjordânia, que juntamente com a Galiléia, fazia parte da sua jurisdição.
14
Jesus refere-se a Herodes como a um animal sanguinário, astuto e traiçoeiro. A expressão "hoje e amanhã" era de uso corrente entre os líderes semíticos e significava um período indefinido de tempo, mas determinado exclusivamente por quem expressava a frase (4.43; 9.22). Jesus faz uma referência clara à conclusão da sua obra redentora na terra.
15
Jesus contemplava a parte final da sua vida de sacrifícios e tinha horror do que via, mas estava resoluto. Sua hora ainda não havia chegado, e ele controlava cada momento que antecedia o seu próprio holocausto. Todavia ninguém o sangraria como a qualquer cordeiro, ele daria sua vida no lugar de cada ser humano que aceitasse o seu sacrifício diante de Deus e se arrependesse de seus pecados (Jo 1.12). Morreria em Jerusalém, como os grandes profetas de Deus que pregaram e foram mortos na Cidade Santa antes dele (2.38; Jo 7.30; 8.20; de acordo com Jo 8.59; 10.39; 11.54).
16 Jesus lamenta-se profundamente por Jerusalém e pela nação israelense não haverem dado o devido valor aos muitos e grandes privilégios concedidos por Deus aos judeus (2Pe 3.9). Muitas foram às vezes em que Jesus esteve pregando sobre o Reino em Jerusalém (Jo 2.13; 4.45; 5.1; 7.10; 10.22). Essa mesma exclamação de dor e lamento foi proferida na terça-feira da Semana da Paixão (Mt 23.37,38).
17 Jesus faz um anúncio tremendo! Após sua morte e ressurreição o Espírito de Deus será retirado da Casa de Deus – o Templo de Jerusalém – e será transferido para um outro templo, não feito de pedras ou por mãos humanas, composto dos salvos, os crentes em Cristo (2Co 6.16; 1Pe 2.5). Deus abandonaria o seu Templo e sua Cidade (21.20,24; Jr 12.7; 22.5 de acordo com Zc 12.10; Ap 1.7; Is 45.23; Rm 14.11; Fp 2.10,11), e só seria novamente visto por Jerusalém no dia do seu glorioso retorno.
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Capítulo 14
1 Os evangelhos registram sete milagres realizados por Jesus em dias de sábado, sendo que cinco deles aparecem em Lucas e os outros dois são narrados por João (Jo 5.10; 9.14). Todas as refeições que os judeus fariseus comiam no sábado eram preparadas no dia anterior conforme as normas da Lei por eles interpretadas.
2
Lucas chama a doença que o homem apresentava pelo nome médico em grego hidropisia, que se refere ao acúmulo de líquidos e fluidos; afetava outras partes do corpo e provocava inchaço generalizado.
3 Manuscritos antigos e fiéis, assim como a KJ de 1611 trazem a expressão "jumento" ao invés de "filho" como aparece em algumas versões. O Comitê de Tradução da KJ entende que essa variante combina melhor com a expressão "boi" que acompanha a frase, e com o contexto mais amplo do ensino de Jesus (13.10-17). Em Dt 5.14 a Lei é determinada tanto para seres humanos quanto para os animais. A ação de Jesus não seria permitida pela lei rabínica dos mestres judaicos, mas sim conforme a Lei mosaica. A letra da Lei, para a pessoa legalista, nega o espírito da própria Lei (Rm 7.6), enquanto a autoridade do Espírito no coração produz a verdadeira justiça da Lei (Rm 8.4). Esse era o ponto de vista que Jesus queria ensinar aos líderes religiosos de sua época: a vida, o amor e a justiça são mais importantes do que milhares de regulamentos e decretos de lei.
4
Jesus já antevia as discussões insensatas por posições e poder na comunidade dos cristãos (22.24) e recomenda que o servo entregue esse assunto ao Pai e aguarde sua promoção em paz, serviço e humildade.
5 Jesus não está falando apenas de boas maneiras, mas da vida espiritual, na qual a humildade é o primeiro requisito para a exaltação, especialmente no Juízo final.
6 Deus não honrará os seus filhos segundo a prática mundana de exaltar aos que têm influência nesta vida, mas conforme o testemunho de Cristo que se doou completamente, revelando uma atitude de total abnegação (Fp 2.6 de acordo com Tg 2.2-4).
7 Todas as nossas intenções e ações têm sua recompensa. Por isso, o cristão sábio é aquele que age de maneira a agradar a Deus e obter sua aprovação na ressurreição dos justos. Há doutrinas que separam a ressurreição dos justos (1Co 15.23; 1Ts 4.16; Ap 20.4-6) da ressurreição geral (1Co 15.12,21; Hb 6.2; Ap 20.11-15). Todavia, todos serão ressuscitados (Dn 12.2; Jo 5.28,29; At 24.15). Os "justos" são os que forem justificados por Deus por causa do sacrifício expiatório de Jesus Cristo e que tiveram comprovado sua fé mediante as suas ações na terra (Mt 25.34-40).
8 Era comum aos estudiosos das Escrituras associarem o reino futuro de Deus a um grande banquete (13.29; Is 25.6; Mt 8.11; 25.1-10; 26.29; ap 19.9). Jesus aproveita a manifestação deste homem para adverti-los, em forma de parábola, sobre o fato de que nem todos entrariam no Reino de Deus.
9 Os homens deram uma série de desculpas falsas, uma vez que ninguém compra terras e propriedades sem ver, ou bois de arado sem experimentá-los. Nem mesmo a rigidez das cerimônias matrimoniais dos antigos judeus privaria o jovem marido de levar sua esposa ao banquete e atender ao convite do seu senhor.
10 A parábola do maravilhoso banquete (grande Ceia) nos ensina: Deus convida a humanidade para entrar em Seu Reino e cear com Ele e seus amigos. Obviamente não há desculpas para não aceitar tal honra, e qualquer recusa será entendida como uma afronta. O evangelho é ministrado de graça e tudo já está preparado para o grande evento. Os homens procuram eximir-se da responsabilidade de atender ao convite do Senhor, pois preferem cuidar de suas propriedades terrenas a fazer parte do Reino (Jo 3.3,5); preferem trabalhar, ganhar, comprar e vender seus bens temporais a receber o Reino eterno de graça (Ef 2.8,9); preferem seus relacionamentos no mundo, como o casamento, às bodas no céu. Assim que a Casa estiver com sua lotação preenchida, virá o fim dos séculos e a completa implantação do Reino de Deus (Rm 11.25).
11
Jesus apreciava o uso das figuras de linguagem a fim de dar maior significado e amplitude aos seus ensinos. Aqui, ele se vale de uma hipérbole vívida (exagero) para revelar que o ser humano deve amar a Deus (Cristo) de forma mais completa e abnegada, que a si próprio e à sua família imediata (Mt 10.37). A expressão "aborrece" como aparece em algumas versões, tem o sentido de "amar menos..." e significa submeter tudo, de forma absoluta, inclusive a própria pessoa, a um compromisso total com Cristo (16.13).
12 A expressão grega original carregar a sua cruz aparece em algumas versões como tomar a sua cruz, mas tem o mesmo sentido de seguir o exemplo de Cristo, consagrar-se absolutamente a Deus, não exatamente numa rebelião política ou militar contra Roma, mas na causa do Reino, até o martírio. Em contraste com a vinda de Cristo para a salvação (Mt 11.28), devemos segui-lo em todos os momentos, dia após dia, como discípulos fiéis. O custo do discipulado é a nossa rendição total ao Espírito Santo em amor. Essa consagração deve ser maior e mais íntima do que todas as nossas afeições familiares (v.26), maior do que todas as nossas vontades pessoais de carreira e sucesso (v.27), e maior do que nossa estima ao dinheiro, bens e poder (33). Paulo compreendeu e pregava esse mistério (Fp 3.8).
13 Jesus é bem claro em nos advertir quanto à importância de não aceitarmos o compromisso do discipulado sem pensar bem sobre seu alto custo e implicações eternas. Por isso não é correto pregarmos somente sobre as bênçãos de andarmos com Cristo; devemos igualmente explicar a todos sobre a grande responsabilidade assumida com Deus por meio dessa decisão pessoal. O perigo de uma decisão irresponsável e insincera é duplo: a zombaria pelo fracasso nesta vida, e a perda total na outra (Hb 2.1-3).
14 Jesus usa mais duas parábolas para frisar o custo de viver como cidadão do Reino na terra, bem como o preço que será pago por todos aqueles que não aceitarem o convite do Senhor para o notável banquete. O ser humano sábio é como o rei consciencioso, que ao perceber o poder do Reino que se avizinha, não espera o confronto final, mas se rende e busca a paz.
15
Cristo compara o crente morno, espiritual e moralmente irresponsável, que não reflete sobre a importância da sua decisão de seguir o Evangelho, com um tipo de sal que havia na Palestina no século I, o qual era tão impuro que perdia o pouco cloreto de sódio que abrigava. Não servia para fertilizar o solo, nem mesmo para decompor-se de modo útil em meio ao esterco (Ap 3.16).
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Capítulo 15
1
Os fariseus e os escribas (mestres da Lei) eram visceralmente contra os coletores de impostos (publicanos) e contra toda pessoa que não cumprisse rigorosamente as suas doutrinas e normas religiosas de comportamento. Referiam-se a essas pessoas como "pecadores" (pessoas de má reputação). Cristo não apenas recebe o "pecador" como oferece a ele a Salvação (representada na partilha do pão). É importante lembrar que Jesus jamais participou do pecado, mas sempre amou aos pecadores e para libertá-los das garras do pecado foi que Ele veio e entregou sua vida (3.12, vs. 4,8; Mc 2.15; At 11.3; 1Co 5.11; Gl 2.12).
2 Jesus responde ao questionamento dos legalistas com histórias de fundo teológico, filosófico e moral que contrapunham o amor longânime de Deus ao exclusivismo dos fariseus, escribas e líderes religiosos. As três parábolas que se seguem: a do pastor que busca; a da mulher que sofre com a perda; e do pai que jamais deixa de amar e perdoa, ensinam o significado do arrependimento (12.54). A volta dos que se extraviaram produz um enorme regozijo no coração de Deus (3.8; At 11.18; 26.20; Rm 2.4).
3
Referências ao pastor e o pastoreio eram comuns durante toda a história do povo judeu. Grandes líderes nacionais e profetas apreciavam esse tema (Sl 23; Is 40.11; Ez 34.11-16). Algumas versões trazem a expressão "deserto", todavia não tem a ver com dunas de areia, mas com campos de pasto não cultivados (Jo 6.10). Jesus nos exorta, como cristãos, a "ir em busca" dos perdidos – como maior estratégia de evangelização – e não simplesmente adotarmos uma postura insensível, crítica e punitiva (14.21,23). Deus em Cristo é nosso maior exemplo de evangelista. Seu amor e persistência em procurar salvar a humanidade ultrapassam a gravidade do pecado humano e a sua própria soberania intocável (Ez 34.6,11 em relação a Gn 3.9,10).
4 Jesus, em algumas ocasiões, valia-se da ironia para destacar o pecado e completa miopia espiritual daqueles que deveriam ser homens de Deus perante seu povo. Os que se consideram justos não sentem a necessidade de se arrepender dos seus pequenos delitos, e acabam pecando por sua arrogância, orgulho e insensibilidade.
5 Lucas faz referência a uma moeda grega (dracma) e não romana (denário). O valor monetário dessas moedas era próximo e equivalia a um dia de trabalho (Mt 20.2). As casas da Palestina, na época de Jesus, não tinham janelas, e o chão era de barro, o que tornava ainda mais difícil a localização de uma pequena moeda.
6 Um pai judeu podia dividir sua herança entre os filhos quando desejasse (garantindo ao filho mais velho o dobro de todos os bens da família, conforme Dt 21.17 e outros textos da Torá), retendo para si, entretanto, as respectivas rendas que obtinha com a propriedade, até sua morte. Contudo, era extremamente incomum dar ao filho mais novo a sua porção na herança mediante qualquer solicitação. Jesus mostra filosoficamente que foi a humanidade, representada pela nação judaica, que insistiu para deixar a companhia de Deus, retirando-se para regiões distantes, áridas e sombrias.
7 A intenção do filho de abandonar suas terras onde vivia com a família e sob os cuidados do seu pai, para viver em completa liberdade, sem precisar prestar contas de seus atos, numa região distante, junto a um povo com outros costumes e cultura, fica bem clara quando ele parte levando consigo tudo o que possuía, sem deixar para trás absolutamente nada à espera de um possível retorno. Queria ficar livre das orientações e restrições impostas pelo pai, gastando conforme o seu bel prazer (hedonismo) sua parte das riquezas que a família havia conquistado, com trabalho árduo, ao longo de muito tempo de disciplina e força de vontade (Sl 107).
8 A maior das vergonhas e dos castigos para um judeu era ter que se aproximar ou lidar com porcos, pois desde a antiguidade judaica esses animais representavam a impureza, a imundícia e o afastamento total de Deus (Lv 11.7).
9
Os revezes, quedas, erros e toda sorte de insucessos representam grandes oportunidades para nos achegarmos ao Senhor, confessarmos amarguras, ressentimentos, fraquezas e pecados, e abraçarmos uma nova perspectiva de vida que não se limita a esta terra, nem a este tempo: é eterna. A Bíblia revela uma humanidade insensata afastando-se do seu Criador, desesperadamente necessitada de recobrar o bom senso (cair em si).
10 No contexto cultural da época e, em respeito ao significado dos termos originais do texto bíblico, cada um dos elementos do vestuário que o pai ordenou que fossem trazidos para seu filho maltrapilho (apenas um símbolo da sua condição espiritual), tinha um significado maior, que não pode ficar ausente do texto correspondente em língua portuguesa. A longa veste representava distinção, o anel de sinete era um símbolo de autoridade e tradição de família (Gn 41.42), e as sandálias demonstravam que ele era filho do senhor daquelas terras, uma vez que os escravos andavam descalços. Um novilho era engordado (cevado) por anos, na expectativa de ser abatido, assado e comido por todos, em uma ocasião memorável.
11
Morto ou perdido é o estado de uma pessoa que perdeu o contato com Deus (Rm 6.13; Ef 2.1) e, por isso, não participa mais da vida de ressurreição e completo resgate em Cristo (Jo 11.25).
12
O amor misericordioso e perdoador do pai simboliza a divina misericórdia de Deus, e o ressentimento punitivo do irmão mais velho assemelha-se à atitude legalista dos fariseus e líderes religiosos que se opunham aos pecadores, gentios e, muito especialmente, a Jesus.
13 O irmão mais velho havia obedecido a seu pai por medo e mera obrigação ritual. Entretanto, colecionava cada amargura em silêncio. O cabrito era considerado um alimento inferior, bem menos caro do que um novilho gordo. O preconceito e o ódio do irmão mais velho não permitiram que ele reconhecesse em seu irmão mais novo o mesmo sangue de família, e, portanto, pudesse também comemorar a sua salvação (livramento, cura).
14 O mesmo ocorre com muitos filhos de Deus; tudo está ao nosso dispor – todas as riquezas do Pai – em Cristo (Ef 1.3). A inveja e a arrogância, contudo, impedem o seu amplo e completo usufruto.